domingo, 31 de janeiro de 2010

SOBROU PARA A MACUMBA? Por Olívia Santana*


As desatinadas declarações do Cônsul-geral do Haiti no Brasil, Senhor George Samuel Antoine, desmontaram o sentido da diplomacia que ele deveria preservar e representar. Ao dizer que a catástrofe que devastou o seu país se deu de tanto o povo haitiano mexer com macumba, Antoine deu vazão ao seu pensamento racista, intolerante, típico de quem não conseguiu livrar-se das amarras do anacrônico preconceito que sedimentou o processo de colonização imposto aos africanos e suas gerações no Haiti e em outras partes das Américas e do mundo.

O que foi dito não se apagou com o formal pedido de desculpas elaborado às pressas pela equipe do consulado. Valeria mais a entrega do cargo, para poupar os haitianos da triste vergonha de ter alguém inapto a representá-los. Conscientemente ou não o cônsul preferiu mascarar a realidade a admitir as verdadeiras razões para o infortúnio vivido pela população daquele país. Sua afirmação de que o africano em si tem maldição, que “todo lugar que tem africano, lá tá f...”, tem menos a ver com o sobrenatural e tudo a ver com os fatos objetivos que marcaram a dominação francesa na antiga ilha caribenha de São Domingos, sob a forma de colonialismo e de escravidão.

Os negros traficados da África para garantir o regime francês de exploração de açúcar, de café, durante séculos, nunca usufruíram do fato de o Haiti ter se tornado a maior potência mundial em produção açucareira. Eram apenas a força motriz da produção, a mão de obra gratuita que forçosamente garantia o acúmulo de capital que desenvolveu a França e outros países da velha Europa.

A revolta escrava, liderada por Toussanint L’ouverture, em 1791, que resultou na conquista da Independência em 1804, foi um marco na história de luta por liberdade e soberania nas Américas, mas o Haiti tornou-se terra arrasada. Os colonizadores foram vencidos, porém já haviam usufruído fartamente das riquezas. Restou ao povo haitiano a sua cultura, a fé nos vodus, o desejo de superar a miséria, ainda que lhe faltassem o domínio dos meios de produção, dos canais de propulsão de relações comerciais mais amplas, tecnologia, sistema educacional e um ambiente internacional favorável ao processo de desenvolvimento e afirmação da sua soberania.

Os haitianos jamais tiveram paz. Sofreram com as intervenções napoleônicas, com as ditaduras e com as manipulações e intervenção de grandes potências, que lhe garrotearam o desenvolvimento. A derrubada do único presidente eleito, Jean Bertrand Aristide, a partir de uma articulação dos EUA e da França, mergulhou o país no mais profundo caos. E desde então os haitianos viveram com o seu território sob ocupação estrangeira.

Terremotos, tsunamis, furacões são fenômenos naturais, muitos deles causados pela devastação que se faz da natureza em nome de um progresso divorciado da ideia de sustentabilidade e equilíbrio ambiental. Quando as catástrofes acontecem, os segmentos mais frágeis acabam pagando o preço. Vale relembrar os efeitos do furacão Katrina em Nova Orleans, que fez avançar as águas do lago Pontchartrain, inundando e enlutando a melódica terra do jazz. Expôs-se aí, a vulnerável face africana dos EUA aos olhos do globo.

A ajuda humanitária das grandes potências ficaria mais bem posta sob o título de Reparação, pois há que se reconhecer que o Haiti paga até hoje a ousadia de ter realizado a primeira revolta negra que tanto assustou o mundo. O país grita por medidas estruturais, por um plano de soerguimento, por autonomia para explorar suas riquezas naturais, para desenvolver seu potencial turístico, cultural, ter acesso às novas tecnologias e aos benefícios da ciência. Urge a realização de mudanças nas políticas migratórias, para que não existam haitianos sofrendo repressão das políticas anti-migratórias.

Ao invés de se atacar a macumba, as religiões de matriz africana, há que se combater uma ordem mundial perversa e excludente, que se converte em maldição contra os direitos básicos da maioria dos povos (principalmente os negros). Que rufem os tambores e se entoem os cânticos em respeito às vítimas e em favor da vida do povo haitiano.

*Olívia Santana, vereadora pelo PCdoB e militante da UNEGRO

quarta-feira, 20 de janeiro de 2010

Clarice Lispector por Clarice


Existir é tão completamente fora do comum que se a consciência

de existir demorasse mais de alguns segundos, nos enlouqueceríamos.

A solução para esse absurdo que se chama "eu existo", a solução é

amar um outro ser que, este, nós compreendemos que exista.


Clarice Lispector

quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

Uma noite a cada dia


Um dia
Uma noite
Sorriso
Tristeza
Conquista
Franqueza
Consciência
Paciência
Tolerância
Fé em si
Fé no mundo
Todo ano é assim
Promessa
Canção
Esperamos que a cada fim
Quando colocarmos
Na balança
O saldo seja positivo
Mas não esqueçamos
Que há males
Que vem para o bem.
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